segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Trabalhos de Elifas Andreato em livro

Reprodução/Desenho de Elifas Andreato
Clementina de Jesus: desenho da cantora é, para Elifas, o seu melhor;
Hermínio Bello de Carvalho o vê como ‘a nossa Monalisa’
O rico e documental trabalho do artista gráfico Elifas Andreato agora está reunido no livro Portfólio Brasil. Seu traço característico marcou a música, em mais de 350 capas de discos; o cinema e o teatro, em cartazes que desafiaram até os duros anos da ditadura, como o da peça Mortos Sem Sepultura, apreendido pela Polícia Federal em 1977; e a literatura, como na prosa densa e inquieta de Clarice Lispector e Murilo Rubião.

“Minha arte se liga à história da minha vida, das vidas assemelhadas à minha, e serve para contar o que eu e pessoas semelhantes a mim entendemos seja o mundo, a justiça e a liberdade”, observa Elifas, no texto de apresentação do portfólio.

A arte de Elifas Andrato originou-se em uma fábrica no bairro paulistano de Vila Anastácio, onde construía cenários para os bailes no refeitório a partir de bobinas de papel de embrulho que serviriam para embalar fósforos. Mesmo amadoras, as pinturas impressionaram um grupo de ingleses que visitaram a empresa e convenceram os patrões de que aquele adolescente pobre deveria estudar artes visuais. Foi o passo decisivo para que ele ingressasse em pequenas agências de publicidade até que, aos 20 anos, arrumou um emprego na Editora Abril, onde se notabilizou especialmente pelos encartes da coleção História da Música Popular Brasileira, no início da década de 1970.

Amizade – Como acompanhava a entrevista com os artistas, familiarizou-se com o trabalho da maioria deles a ponto de ser convidado por Paulinho da Viola para desenhar a capa de seus discos. Nasceu uma amizade tão próxima que, no LP “Nervos de Aço”, de 1973, Elifas expôs um delicado problema sofrido pelo músico na época: seu desenho com uma lágrima escorrendo e um buquê de flores indicava a separação de Isa, a primeira mulher.

“Pode parecer presunçoso, mas considero que foi com esse disco que inaugurei as capas de LP no Brasil. Encontrei um nicho que ainda não havia sido explorado por aqui”, disse ele ao Jornal da Tarde em 2006, quando foi aberta uma exposição em homenagem aos seus 60 anos.

Sua forma peculiar de trabalhar, sempre se aproximando do artista previamente, permitiu a descoberta de detalhes que transformavam especialmente as capas de LP em verdadeiras obras de arte. Para o disco comemorativo dos 70 anos de Adoniran Barbosa, por exemplo, em 1980, ele desenvolveu um estudo que mostra o rosto do artista com uma lágrima escorrendo. “Elifas, sou esse palhaço triste”, vaticinou o músico.

Para o teatro, Elifas – irmão do ator e diretor Elias Andreato – criou cartazes memoráveis. “Calabar”, de Chico Buarque e Ruy Guerra, ostenta o desenho anatômico dos músculos do corpo humano cobertos por uma pele de porco tatuada. O homem cabisbaixo que figura no cartaz de “A Morte do Caixeiro Viajante”, dirigido por Flávio Rangel em 1984, foi elogiado pelo próprio autor da peça, o americano Arthur Miller, que, em carta ao diretor, confessou mantê-lo pendurado na cozinha: “É onde posso admirá-lo todos os dias”, contou o dramaturgo. “Vai ser difícil escrever a história das últimas décadas do Brasil sem ilustrá-la com a arte de Elifas”, observa Fernando Morais, no prefácio do portfólio.

Serviço:

Elifas Andreato – Coleção Portfólio Brasil
J.J. Carol Editora, 132 págs., R$ 49

Fonte: O Estado de S. Paulo

Nenhum comentário: